Eu não sou lá muito fã de luta, muito menos ainda de UFC,
e menos ainda de luta entre mulheres (as quais não se deve apanhar nem com uma
flor, mesmo que de outra mulher), mas no dia 01 de Agosto de 2015 eu abri uma
exceção. O duelo entre Bethe Correia e Ronda Rousey beirou ares épicos, traços
novelescos e ingredientes característicos dos dramalhões hollywoodianos que
faziam as delícias indigestas que usualmente passavam nos telecines da Sessão
da Tarde na televisão.
Parecia uma sequência esdrúxula do filme Rocky, O Lutador,
mas que dessa vez feminino. A menininha americana branquinha e bonitinha era
desafiada por uma brutamonte de um país estranho, desconhecido e exótico
chamado Brasil. A menininha linda, cândida de olhos azuis, do alto da sua
invencibilidade, chora quando a feiosa vilã comunista (nos filmes americanos
quase todos os vilões são comunistas) provoca dizendo para a americana não se
matar como se matou o seu pai. Lembranças em flashback. Depois um plano
sequência, da menininha americana treinando intensamente ao som do clássico
tema musical composto por Bill Conti, mais lembranças em flashback e mais
lágrimas, nessa hora os telespectadores grudam os olhos na TV, uma cena de luta
a malvada vilã feiosa comunista brasileira derrota de forma humilhante a melhor
amiga da linda loirinha americana, e faz mais ameaças. Cena aérea, um avião se
aproximando do Rio de Janeiro, a exótica cidade do exótico país, onde vai ter a
luta. Hora da pesagem. A menininha americana, doravante chamada heroína, cara
séria, fechada, olhos tristes e compenetrados. A vilã brasileira, arregalando
os olhos e aumentando o tom das ameaças. Noite da luta. Uma sequência de golpes
(mais flashbacks), o soco fatal, knock-out, a bandida brazaca depois de apanhar
muito, cai na lona, a heroína americana sorri vitoriosa (voz em “off”: “...é
pra você, papai”). Só faltou passar os créditos na tela, depois a musiquinha
irritante da vinheta da Sessão da Tarde e o anúncio da novela que vem depois.
A típica história americana de superação com viés
nacionalista... “nós, ianques somos melhores, heróis, lindos de olhos azuis,
vencemos todos os povos exóticos e feios que ameaçam nosso lindo estilo de
lida”... Nossa, como eu vi porcaria cinematográfica
na minha vida. Acredito que todo mundo, literalmente todo o mundo, já assistiu
algum filme com estas mesmas características. E se não fizerem um filme com a
história da luta do dia 01/08/2015 num futuro próximo é porque todos os
roteiristas americanos estão em greve. Eu aposto que vai ter um filme em breve,
dou meu dedo mindinho.
Mas o que mais me chamou atenção não foi só jogo midiático
que envolveu este combate, se foi verdadeiro, ou jogo de cena pra incrementar a
audiência, isso eu não sei, só sei que funcionou comigo, que, como disse antes,
nunca fui fã de luta, contava as horas pra ver combate.
Outra coisa que me deixou espantado foi a quantidade de
brasileiros que deixou de torcer por uma brasileira pra torcer por uma gringa,
e como justificativa, as mais esdrúxulas, tipo: “ela é chata” ou “ela é feia”,
pra mim tudo balela, na minha opinião Bethe Correia é tão bonita quanto Ronda
Rousey, quanto a simpatia, bem, isso é difícil de qualificar ou quantificar,
afinal tudo era um espetáculo midiático, o que se via eram personagem, o
argumento do filme perfeito da Sessão da Tarde, como eu descrevi antes.
A verdade é que o povo brasileiro tem autoestima baixa, e
isto não tem nada a ver com a crise artificial que a grande mídia nos impõe, ou
com o governo Dilma, ou os 7x1 do jogo da Copa, não tem nada com isso, o
brasileiro tem a baixa autoestima no seu DNA.
Ter baixa autoestima não “privilégio” só dos brasileiros,
vários povos ao redor do globo já tiveram crise de autoestima: os japoneses
quando o Imperador Hiroito negou sua ascendência divina, os alemães quando derrotados
nas guerras mundiais, os americanos quando foram expulsos do Vietnã, os russos
quando acabou a União Soviética, enfim, vários povos, a diferença é que eles
superaram e se reafirmaram, de uma forma ou de outra, já nós não, somos assim,
temos raiva de os mesmos, e isso, considero, ser a principal característica da
brasilidade, além do jeito latino, a pele morena e o falar língua portuguesa.
O que me deixou triste também não foi só ver uma conterrânea
minha, lá de Campina Grande, cair ensanguentada e inconsciente no octógono, mas
sim ver a quantidade de ofensas nas redes sociais, principalmente a tal terra
de ninguém chamada Facebook, ofensas racistas e machistas, tipo: “essa ‘paraíba’
pensa que é gente, quem é ela pra derrotar Honda (sic)” ou “...essa paraibana
sapatão não é pairo pra princesa do MMA” ou “...devia ter apanhado mais” ou ...
“32 segundos foi pouco” ou “bem feito pra essa desqualificada” ou “pena que apanhou
pouco”....e muitos outros que nem lembro, nem quero lembrar, mas mostram que
além da baixa autoestima, o brasileiro comum tem baixa percepção do mundo e
alta doses de machismo, sexismo e preconceito.
São essas coisas que contaminam com baixa autoestima a
minha brasilidade....também.