Há muito
tempo, na cidade de Livramento, interior do estado da Paraíba,
quatro cabras jovens se reuniram pra fazer música. Eles tinham
acabado de concluir o científico (atual ensino médio), estavam
desempregados, não tinham o que fazer, não queriam, nem podiam
viver ainda sob os auspícios de suas empobrecidas famílias, não
tinham habilidade específica pra nenhum trabalho, a não ser ses
dons naturais para a música. Em casa ouviam muito Luiz Gonzaga, o
rei do baião, além de grupos como Os Três do Nordeste e um pouco
de Jackson do Pandeiros.
Como eu
disse, eles eram quatro: João Lemos, no triângulo, Paulo Macário
no acordeon, Jorge Henrique no violão, e Ricardo Siqueira no
zabumba. João era o mais inteligente de todos, politizado, culto,
dono de um humor mordaz, não deixava de puxar um briga se
considerasse que algo estava errado; Paulo fazia o tipo romântico, a
maioria das músicas do grupo era de autoria dele, e as letras eram
extremamente “açucaradas” cheias de metáforas de amor; Jorge
era um músico excepcional, mas era metido a místico, dizem que de
vez em quando ele tinha umas visagens da Jurema Sagrada; Ricardo era
o tipico cara gente boa, o amigo de todo mundo, se dava ( e ainda se
dar) bem com qualquer pessoa, ele era descendente de ciganos e
adorava usar aneis em todos os dedos e um pesado colar com uma grande
estrela de Davi dependurada, por isso deram a ele o apelido de Anelo
Estrela.
Todos os
finais de semana eles tocavam à no sítio Taverna, até que um dia
um locutor de uma FM de Recife os viu tocar e os convidou para ir à
capital pernambucana para se apresentar.
Vixe.
Eles toparam na hora, e fizeram bem, foi sucesso imediato, todo mundo
gostava do forrozinho pé-de-serra que eles apresentaram e mais com
as letras românticas de Paulo caíram bem nos gostos de todos, do
universitário ao analfabeto, do brega ao clássico, da elite ao
povão. Todos, absolutamente todos, gostavam do som dos Bisouros (
sim, esse era o nome do grupo) isso porque eles costumavam ensaiar
no pátio da quadra poliesportiva lá de Livramento, até que um dia
um enxame os atacou e assim eles ficaram conhecidos como os “menino
que levaro uma carreira dos bisouro” e assim ficou.
Em Recife
eles gravaram um CD que, que mesmo com toda pirataria e 'downloads'
ilegais pela net, vendeu feito água. Mal a bolacha prateada de
plástico chegava às lojas, esgotava. E a agenda de shows estava
mais que lotada. Tinha apresentação em todo o Nordeste, chegou ao
ponto de ser marcado duas apresentações no mesmo horário mas em
cidades diferentes (e como se resolvia isto?), numa das cidades se
montava um telão e nele passava as imagens do DVD dos Bisouros do
Forró, e a galera nem se importava e ia do mesmo jeito.
Eles
foram pra São Paulo, fizeram aparições em todos os programas de
TV, audiência GARANTIDA. E finalmente os Bisouros conquistaram o Sul
e o Sudeste com o forró. Paulistas, gaúchos e sulistas em geral
esqueceram suas tradições, seus fandangos e vanerões e aderiram
com tudo ao velho e bom pé de serra.
Mas a
verdade é que o bom, nem sempre dura e se dura, exige muito de quem
o cria, e com os Bisouros não suportaram o peso do sucesso e os egos
inflados dos competentes, tudo, enfim, contribuiu para aumentar a
tensão entre os componentes. Eles disseram que não iam mais fazer
shows, iam só gravar Cds. Os fãs ficaram decepcionados, mas mesmo
assim a legião só aumentava.
Até que
num belo dia, as pressões sobre os meninos, a demanda por mais e
mais coisas novas, o cansaço das relações interpessoais e
artísticas desgastadas entre os componentes do grupo foi forte
demais e eles acabaram o grupo.
João se
mudou para São Paulo, casou com uma nissei do Bairro da Liberdade, e
acabou assassinado em circunstâncias estranhíssimas. Paulo
continuou com carreira solo, cantando as músicas consagradas dos
Bisouros e alguns canções novas, era a melhor maneira dos fãs que
não tiveram o previlégio de ver os quatro reunidos, ouvir pelo
menos na voz de ao menos um dos integrantes. Jorge continuou com suas
vezes de místico, tocava violão durante cultos do Santo Daime, até
que foi acometido de um linfoma e faleceu numa cidadezinha do
interior de Minas Gerais próximo ao Céu (como é assim chamadas as
'Igrejas' do Santo Daime) que ele frequentava, e acabou indo pra o Céu (paraíso) de verdade. Anelo voltou pra
Livramento, abriu um Lan House e está feliz da vida até hoje
continuando sendo amigo de todo mundo.
A
história dos Bisouros do Forró só mostra duas coisas. Primeira: se
você quiser ser eternizado, largue o que você está fazendo, quando
estiver no auge (Pelé fez isso muito bem, já Ronaldo, não).
Segunda: não adianta cobrar novos clássicos de quem já fez coisas
boas demais.